Peça: Embargos de declaração contra sentença que extinguiu o feito por abandono da causa. A parte autora não foi intimada pessoalmente e não houve requerimento do réu. Prequestionamento das violações aos artigos 267, §1º e §3º; 128 e contrariedade a súmula 240 do STJ. Possibilidade de efeito infringente/modificativo.
Esta semana, me deparei com a seguinte situação: o juiz extinguiu um cumprimento de sentença após os patronos da parte serem notificados – via processo eletrônico – para dar andamento ao feito e manterem-se inertes.
Eu, naturalmente, queria qualquer coisa que permitisse ao juízo se retratar, visto que a jurisprudência é pacífica quanto a necessidade da intimação pessoal da parte. Pensei em fazer uma apelação, mas meus colegas recomendaram primeiro os Embargos de Declaração.
No escritório anterior, meu chefe tinha o hábito de fazer Embargos de Declaração apontando os dispositivos violados pela sentença. Eu achava o timing ideal para isso, apesar de saber que os ED são pouco queridos pelos magistrados. Então, aqui segue a peça que redigi para o caso acima.
Pessoalmente, sinto muito prazer ao redigir uma peça. Amo escrever, amo formatar, escolher a fonte, espaçamento… enfim! Na minha opinião, uma peça bem redigida – estética e redação – diz muito sobre o nosso zelo enquanto profissional. E todos os detalhes contam (como o currículo rosa e perfumado da Elle Woods).
Cabeçalho. Eu passei um bom tempo escolhendo a fonte, espaçamento e altura do texto. Tudo foi utilizado com as configurações do próprio Word e o logo eu mesma fiz no Photoshop utilizando as fontes de lá. Não é nada muito elaborado, mas dá mais credibilidade para a nossa peça.
Endereçamento. Entendo quem gosta de abreviar, mas sempre prefiro de colocar tudo por extenso. Eu aprecio o capricho que escreve-las integralmente denota. O zelo demonstra o respeito que temos pelo nosso trabalho, bem como pelo juízes e servidores. Além disso, gosto de usar a fonte assim toda maiúscula, com a primeira letra maior (Versalete), no endereçamento. Dá um ar realesco que eu amo!
Tempestividade. Confesso que não é sempre que eu julgo necessário inaugurar a peça com um tópico acerca de sua tempestividade, mas é sempre bom!
Rodapé. Eu, particularmente, AMO colocar observações, legislação, redação de artigos etc no rodapé. As informações permanecem na peça, mas não quebra a fluidez do texto.
Síntese da ação. Sempre gosto de fazer uma breve narrativa no início da peça e aproveito para apontar minhas próprias conclusões. Sabe? Contando os fatos da nossa perspectiva. Por exemplo, nesta peça, eu expliquei a situação e já disse o que pensava sobre ela: que a sentença ignorava a ausência da intimação pessoal da autora e do requerimento do réu. Achei pertinente colocar a jurisprudência do STF – que eu li numa peça da defensoria pública de SP – porque rola esse preconceito com ED. Mas, entendam: Advogado tem que aproveitar qualquer oportunidade pra defender os direitos do seu cliente! Então, havendo um instrumento pra elucidar uma decisão, ela deve ser aproveitada e isso não pode ser mal visto pelos julgadores.

Ausência de intimação pessoal da autora. O juiz determinou a intimação da autora através de seu patrono via processo eletrônico. Todavia, o dispositivo legal diz que a intimação deve ser pessoal. Eu até entenderia o posicionamento se a procuração tivesse poderes especiais para citação e ou intimação. Mas não é o caso! Por isso, penso que ele não observou o disposto no artigo. 267, §1º do CPC. Claro que isso poderia ser diretamente suscitado numa apelação e alguns até diriam que seria a única solução. Mas um colega sugeriu os ED e eu penso que é sempre melhor que seja oportunizado ao juiz que se manifeste sobre sua própria decisão – quando possível – antes de arrastá-la pra outras instâncias, principalmente, para fins de prequestionamento, como é o caso. Se vocês notarem, também dei uma refletida sobre o intuito da norma na abertura da norma. Acho que esse exercício ajuda a sair daquela atividade mais mecânica, humanizando os processos. Não estamos aqui para sermos robôs, mas sim, para solucionar conflitos e assegurar direitos!

Ausência de requerimento do réu. O STJ sumulou entendimento de que o processo só pode ser extinto por abandono de causa se a extinção for requerida pelo réu. Eu penso que isto coaduna com o disposto nos artigos 267, §3º e 128 do CPC. Primeiro, porque o legislador menciona expressamente as hipóteses em que o juiz poderá extinguir o feito de ofício no §3º. Tudo bem, o rol pode até não ser taxativo, mas ele não foi posto ali à toa. Ademais, penso que esta iniciativa seria uma forma do juiz agir como parte, o que é expressamente vedado pelo artigo 128 do CPC. Como bem disse o STJ não seria razoável presumir que o réu não tenha interesse na resolução do conflito.
Pedido. No último tópico, gosto de fazer um pequeno arremate. Sempre imagino que há leitores de peças que podem ir direto para os pedidos ou passar meio batido por alguns tópicos. Então, ainda que sucintamente, gosto de apresentar meu argumentos de forma objetiva. On point! Só por precaução…
É isso! Espero que este post auxilie colegas que encontram dificuldades para redigir uma peça. Eu sentia muita dificuldade para começar a redigir as peças, porque não sabia muito bem o que era importante escrever. Então, aqui fica minha contribuição!
[UPDATE EM 06/08/2015]
Os Embargos não foram acolhidos (COMO ASSIM, JUIZ?). O argumento do Magistrado foi o seguinte:
“Isso porque o artigo 9º, §1º da lei 11.419/06 estabelece que o processo eletrônico, todas as citações, intimações e notificações, inclusive da Fazenda Pública, serão feitas por meio eletrônico asseverando que as citações, notificações e remessas intimações, que viabilizem o acesso à íntegra do processo correspondente serão consideradas vista pessoal do interessado para todos os efeitos legais.
A credora estava bem representada nos autos por Advogado Particular, entretanto, desde a prolação da Decisão xxxx – em abril de 2015 – não mais se manifestou no processo, muito embora intimada para tal (vide xxxxx), o que culminou na extinção do feito, em razão da desídia da credora.
Registre-se que no decisum xxxxxx o magistrado sentenciante esclareceu que, em se tratando de processo eletrônico, as intimações ocorridas que viabilizem o acesso ao processo, são consideradas vista pessoal para todos os efeitos legais.”
Enfim, apelei sob o argumento de error in procedendo, requerendo a anulação da sentença. A jurisprudência é clara, pacífica e recente, com julgados do STJ de 2014 e 2015! Inclusive, a uniformização de jurisprudência tá pegando no NCPC, então, bati bem em cima disso na minha Apelação. #vidaquesegue